OS SEGREDOS DO CHÁ
Conheça as peculiaridades de uma das bebidas mais consumidas no mundo e os seus benefícios para a saúde
Tamires Alês / Fotos Divulgação
Com uma história de milhares d
e anos e uma variedade de cores e sabores que permitem combinações mil, os chás acumulam apreciadores e especialistas pelo mundo. Considerado a bebida mais consumida no planeta, depois da água, ele ainda não caiu no gosto dos brasileiros, que ainda o consomem principalmente com alguma intenção terapêutica, e não para saboreá-lo. Por não fazer parte originalmente da cultura do nosso País e ter o café como grande concorrente, o chá ainda aparece de maneira modesta no cardápio dos tupiniquins, contrastando com os povos orientais, como os chineses e indianos, os que mais consomem a bebida.
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Mas, antes de se aprofundar na história do chá e nos seus sabores é preciso esclarecer que nem tudo pode ser considerado chá. Isso mesmo, as plantinhas colhidas no quintal de casa como boldo e cidreira, e todos os seus parentes como mate, camolila, hortelã e erva doce, são na verdade infusões. No Brasil adotamos o termo, de forma errônea, para designar todos os tipos de ervas, como os vendidos em saquinhos em supermercados. Mas, só pode ser considerado realmente chá as folhas provenientes da camélia sinensis – planta da família das camélias, cultivada, geralmente, em países asiáticos.
Essas folhas dão origem a quatro grupos de chás, o que diferencia a cor e o sabor de cada um, é o grau de oxidação das folhas. No chá verde, por exemplo, o processo é interrompido logo depois da colheita, o que resulta em um produto de sabor bastante suave. Já o branco, tem uma oxidação leve, cerca de 2% a 4%. No estilo oolong é interrompido na metade do processo, o que garante um sabor de pêssegos maduros. E o preto, o mais complexo de todos, a oxidação é total.
Além desses tipos básicos, pode haver uma variedade infinita entre eles. Segundo a especialista em chá, Carla Saueressig, 50 anos, proprietária da A Loja do Chá, a oxidação das folhas pode ser interrompida a qualquer momento criando um chá diferente com características únicas.
Os principais produtores estão na Ásia: China, Japão, Índia, Siri Lanka, Indonésia, Kênia e Taiwan. Segundo a especialista, a China é o único país que produz todos os tipos de chás, e a Índia é o principal produtor mundial da bebida. Ela explica que algumas regiões fazem apenas uma colheita por ano, geralmente chás mais especias, outras variam de 3 a 5 colheitas ao ano. “Elas acontecem do final de março a final de outubro, as árvores do chá têm no máximo 1,5 metros e as folhas quase sempre são colhidas por mulheres”, detalha Carla.
Origem
Há muitas teorias sobre a origem do chá, mas, segundo Carla, os registros mais antigos são da China, cerca de 2.700 anos a.C. “Por
não ser oxidado, com certeza o chá verde foi o primeiro a ser consumido, porém os chineses logo começaram a utilizar as técnicas e processos para preparar os outros tipos de chá e já passaram a consumir os oolong e preto”, revela. Da China a bebida foi levada para o Japão por monges Zen-budistas, por volta de 600 anos d.C, “por isso a forte relação da bebida com a religião no país”, explica a especialista. E se espalhou por todo o continente.
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Na Europa, o chá foi introduzido primeiramente na Holanda, depois em Portugal, e só por volta de 1600 anos d.C. que chegou a Inglaterra. Os ingleses conheceram o chá por intermédio da Índia, que nessa época era sua colônia. “Por causa da queda do café eles começaram a utilizar o chá preto, e até mesmo consumí-lo com leite”, conta Carla. E foram eles os responsáveis por ocidentalizar a bebida. Segundo a especialsita, na época da Revolução Industrial eles ditavam moda pelo mundo e como consumiam chá passaram esse costume para os outros países ocidentais.
Já no Brasil, a plantinha chegou pelas mãos de D. João VI, por volta de 1800. Além de alguns chás que estava habituado a tomar em Portugal, o rei trouxe algumas mudas para serem plantadas aqui. “A primeira plantação de chá que se tem notícias no Brasil, foi realizada por padres no Jardim Botânico do Rio de Janeiro”, afirma Carla. Segundo ela, o gosto pela bebida só se fortaleceu no País com a chegada dos primeiros imigrantes japoneses, em 1900. A cidade de Registro, no interior de São Paulo, foi a região que mais recebeu plantações da bebida.
Atualmente, de acordo com a especialista, há em torno de cinco locais que plantam chá no Brasil, mas infelizmente a qualidade é inferior a dos países asiáticos. Isso porque “a concorrência com o café é desleal, e os produtores acabam desistindo de plantar chá e preferem ficar com os cafezais”. Entre as ervas, a mate – uma das mais consumidas pelos brasileiros, tem maior destaque no país, com diversas plantações na região sul do Brasil, nos estados do Paraná e Rio Grande do Sul, que até exportam para diversas nações do mundo.
Chá gourmet
Com o mesmo objetivo, o de difundir o consumo de chá pelo Brasil – não como um remédio e sim como uma bebida prazeirosa, que pode e deve ser apreciada a qualquer hora do dia – duas empresárias, inauguraram, em épocas diferentes, casas de chás em São Paulo, especializadas em chás gourmets, que podem ser considerados a “alta-costura” dos chás.
Com um trabalho feito a conta gotas, Carla tenta há mais de 10 anos mudar a visão um tanto estigmatizada das pessoas em relação aos chás. Ela está a frente da A Loja do Chá – lançada em 1999 em um espaço aconchegante no Shopping Iguatemi, zona oeste da capital paulista, a primeira do gênero a ser inaugurada no País. Carla comercializa chás especiais da marca alemã Tee Gschwendener, da qual também é representante na América do Sul. Com o seu peculiar sotaque gaúcho, ela não cansa de repetir, o que é quase um mantra, para a especialista e teablender (criadora de chá): “Eu vendo chá prazer, não chá remédio!”.
E coloca prazer nisso. São mais de 250 versões da bebida, todas orgânicas, produzidas em países como China, Índia, Sirilanka, Indonésia, Kênia, Taiwan e Japão. As ervas ficam armazenadas em gavetas e os clientes podem montar a combinação que desejar, como um chá preto mais cítrico ou mais floral. Segundo a proprietária, o chá verde ainda é a grande tendência, “tanto o puro como os aromatizados com frutas e flores”. Já os mais vendidos são os frutados, principalmente os de frutas vermelhas.
Carla já provou todos e pede cada um por seu número. “Conheço todos, são muitos anos trabalhando com eles”, explica diante do espanto da repórter. Tamanha experiência com as diversas ervas, garante a empresária convites para montar cartas de chás para restaurantes, eventos e fóruns, dar cursos e aulas em entidades especializadas, além de criar blends exclusivos para empresas e restaurantes. O projeto mais recente foi um blend criado para a companhia área TAM, servido apenas nos voos internacionais. “Demoro cerca de um mês para criar um blend, e o resultado vai depender do estudo que fiz sobre a empresa e o que eles desejam”, detalha.
Na Loja, todos os dias um tipo de chá é escolhido para degustação, uma xícara grande, de 250 ml, custa em torno de R$ 5,50. Apetrechos de todos os tipos para preparar um delicioso chá, também podem ser encontrados. Além disso, de terça-feira a sábado, das 16h às 19h, é servido o chá da tarde, a R$ 48,00 por pessoa. Opção para quem deseja experimentar os chás, já que o consumo é livre (com exceção de alguns chás especiais) e os quitutes, doces e salgados, da casa. “Mesmo sendo um crescimento tímido, percebo que o consumo do chá pelos brasileiros tem aumentado ano a ano, mas, infelizmente, ainda estamos bem longe dos países asiáticos, cujo o ato de beber chá é algo cultural”, desabafa.
Com menos tempo de estrada, mas com a mesma paixão pela bebida, Mônica Rennó, inaugurou no final do ano passado a Talchá, no shopping Pátio Higienópolis – a primeira marca brasileira de chá gourmet. A empresária nunca foi muito fã de chá, já que as lembranças que tinha da infância era de uma bebida associada a doença e muito amarga. Tudo mudou após uma viagem a França onde descobriu um universo formado por chás perfumados e saborosos. Voltou ao Brasil, se especializou no assunto, largou o emprego na área de marketing e investiu no novo empreendimento.
Em sua loja é possível encontrar uma variedade com cerca de 60 chás e infusões, com sabores que variam entre mix de frutas, menta e blueberry. A maioria vinda de países asiáticos, mas há também um chá verde brasileiro, o Bossa Nova, cultivado em São Miguel Arcanjo, e um rooibos sul-africano, sem cafeína e naturalmente adocicado. “Os mais procurados na loja são os chás verdes com aroma cítrico ou com morango e o rooibos”, enumera a proprietária.
Além das bebidas, dispostas em partileiras como se fosse uma biblioteca, Mônica investiu em diversos acessórios, como infusores, canecas e bules, “para deixar a vida dos consumidores de chá mais simples e prática”, tudo em belíssimas embalagens. Completam o cardápio comidinhas que harmonizam muito bem com a bebida, como salgados, saladas e alguns pratos quentes como escondidinho. Se tiver só de passagem também é possível experimentar o chá do dia, oferecido para degustação.
** Confira a matéria na íntegra na versão online da revista Mundo Ok.